2022 chegou. E agora?

Por a 7 de Fevereiro de 2022 as 10:58
Sérgio Guerreiro, Professor Universitário. Diretor Executivo, Westmont Institute of Tourism & Hospitality, Nova SBE

Quase dois anos depois do início da pandemia Covid-19, quase todos achávamos que estaríamos hoje com menos dúvidas relativamente ao futuro e que o quadro de incerteza em que vivemos neste período se teria reduzido de forma significativa.

Uma imagem que Ian Yeoman (@tomorrowstouris), reputado investigador da Victoria University of Wellington da Nova Zelândia e especialista em turismo do futuro, partilhou recentemente na sua conta de Twitter traduz muito bem a forma como toda a comunidade turística olha para o ano de 2022.

Algum receio em saber o que o Ano Novo revela, mas, ao mesmo tempo, muita curiosidade acerca das transformações no mercado que a pandemia nos trouxe. Afinal, foram dois anos de mudanças constantes de cenários de mercado e a cautela nas análises passou a ser a regra.

A incerteza passou a fazer parte do framework estratégico de qualquer organização do setor do turismo e os desafios de curto prazo permanecem relativamente imutáveis desde março de 2020: conseguiremos conter a pandemia e as sucessivas variantes da Covid-19? As restrições às viagens vão evoluir num sentido em que a mobilidade a que nos habituámos volta a ser possível? Conseguiremos ter um alinhamento internacional sobre as regras de viagens e padrões que possam ajudar consumidores e empresas a ajustar as suas escolhas? Quais as preferências dos consumidores depois de um período de profunda transformação das relações sociais e da forma de viver em sociedade?.

Estas são perguntas que fazemos todos os dias e cujas respostas têm vindo a evoluir com o tempo, muito alinhadas com a evolução da capacidade de controlo da pandemia e das respostas políticas que os países têm tomado neste domínio.

O quadro de incerteza é tal que muitos advogam que estamos perante um “new normal”, em que muitos dos alicerces do turismo como o conhecemos se irão alterar de forma profunda. Prefiro olhar para este cenário de disrupção como indutor não de uma rutura rápida, mas sim de vários períodos de adaptação à envolvente, cada um sendo como que um “next normal”.

Apesar da ameaça que a variante Ómicron parece trazer à mobilidade internacional de pessoas, num cenário que faz lembrar o vivido há exatamente um ano, a verdade é que vamos assistindo a pequenos sinais de que países, empresas e consumidores se estão a adaptar a esta nova conjuntura.

De facto, se alguns países optaram por voltar a confinar perante o crescimento do número de casos, outros há que optaram por medidas de adaptação perante a escalada do número de registos que tentam promover o equilíbrio possível entre a saúde e a economia, reconhecendo não ser possível voltar ao cenário de lockdown total que vivemos nos primeiros meses de 2021. A crescente normalização internacional de certificados e testes tem ajudado neste processo, ao mesmo tempo que a evolução do processo de vacinação, sobretudo nos países do hemisfério Norte, dá mais garantias de segurança e de previsibilidade a quem quer viajar.

Há um longo caminho a percorrer até chegarmos aos níveis de tráfego internacional de 2019, mas é um sinal de algo está a mudar nesta matéria.

Ao mesmo tempo, são crescentes as correntes que falam de uma passagem de um cenário de pandemia para endemia, o que faz crescer os indícios de uma viragem para um “next normal” em que a convivência destas duas forças tenderá a ser cada vez mais natural.

Por outro lado, a confiança dos consumidores parece permanecer relativamente estável apesar da variante Ómicron. De facto, o índice de confiança do consumidor da OCDE não repetiu a quebra sem precedentes ocorrida nos finais de 2020 e início de 2021, e estudos recentes da Skift apontam para um crescimento anual das viagens bastante robusto em 2022, ao mesmo tempo que se projeta que os valores de 2019 sejam atingidos em 2024. Por outro lado, um estudo da McKinsey mostra que a confiança dos consumidores na Europa está a aumentar e que, no seu pacote de preferências, privilegiam cada vez mais atividades turísticas, como viagens de turismo e idas a restaurantes. Importa ainda sublinhar que as viagens domésticas estão a ganhar preponderância nas escolhas dos consumidores, algo que os analistas referem tratar-se de uma tendência que ficará para além do contexto de pandemia.

Por fim, se o (real) impacto económico da pandemia no setor do turismo não é ainda totalmente conhecido, não é menos verdade que se se começam a observar alterações importantes na estrutura do mercado.

São evidentes as alterações de modelos de negócio, impulsionados pela digitalização, pela introdução de novas tecnologias ou associadas à sustentabilidade. Este é um processo que está ainda no seu início e que será em muito impulsionado pelos estímulos financeiros nos próximos anos. Digitalização e transição climática estão hoje na agenda de todos as estratégias turísticas e serão um campo fértil de inovação no setor.

Por outro lado, o volume de fusões e aquisições no setor do turismo em 2021 foi relevante, em resposta à necessidade de conferir maior robustez às empresas, embora tenha ficado aquém das expetativas iniciais. Muitos analistas esperam que o progresso na recuperação do setor, a par com a tendência para redução dos estímulos dos governos nos próximos anos, vão impulsionar de forma significativa o volume de negócios neste domínio em 2022, que um artigo recente da Skift classificava de “dilúvio”, com várias operações projetadas para os próximos meses na área hoteleira, indiciando que os operadores internacionais confiam que o pior da pandemia já ficou para trás.

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