Opinião | Más influências

Por a 24 de Junho de 2021 as 9:39

Sem ser uma contabilização muito rigorosa, diria que nos últimos anos recusei cerca de 90% dos milhares de pedidos de colaboração que recebi de autointitulados “Influencers”.

Nada tenho contra influenciadores e essas decisões foram sempre baseadas em parâmetros de avaliação das oportunidades. Ainda assim não posso mentir e deixar de dizer que há um enorme equívoco de muitas pessoas, quanto ao potencial de influência e impacto para as marcas. Para esta constatação não vou utilizar a questão do número de seguidores, que em muito casos pode ter criado uma falsa sensação de reach. Na verdade, o equívoco não está na quantidade, basta perceber que a qualificação de uma audiência está em grande parte relacionada com as suas caraterísticas e preferências, e não é meramente um exercício de contar cabeças. Diria até que para muitas marcas, em especial aquelas que querem ter uma verdadeira afirmação de diferença em comunicação, os influenciadores com mais impacto são aqueles que têm penetração em micro segmentos.

Assim, o ponto que pretendo destacar, como razão para uma espécie “explosão” de perceções erradas quanto ao que é ser “influenciador”, prende-se sobretudo com a falta de qualificação para o exercício dessa atividade. Sim, querer viver de algo nem sempre está relacionado com talento. Ser influenciador requer qualificações, algumas das quais num nível mais subjetivo, como o bom-gosto, o bom-senso, a criatividade, a empatia e o carisma, mas outras há outras, num nível mais técnico, que são igualmente importantes. Alguém poderá ser um influenciador completo se não tiver skills de comunicação, de escrita, de captação de imagem ou de cuidado gráfico e apresentação?

Quando recuso grande parte dos pedidos de colaboração de influenciadores, em geral solicitando a oferta de noites gratuitas e refeições em troca de publicações nos seus perfis social, faço-o com a consciência que, em algum dos parâmetros que considero fundamentais, não estavam reunidas todas as condições para avançar com esse investimento. O fit dos conteúdos, ou do conceito de comunicação desse influenciador está de acordo com os valores da marca? O estilo de publicações é compatível com o posicionamento e perceção de valor da marca? A audiência desse influenciador tem qualificação relativamente aos segmentos naturais da marca? O pedido é razoável relativamente ao que é solicitado e tem em conta a sazonalidade para determinada unidade? A contrapartida é justa e devidamente acordada à priori? A grande maioria das vezes a resposta a pelo menos uma destas perguntas é negativa.

Não está em causa o papel que o marketing de influência tem num plano de comunicação e promoção, parece-me evidente que há vários fatores que apontam para esse recurso como sendo estratégico no contexto atual, bem como vários exemplos bem-sucedidos. É, no entanto, decisivo que as marcas hoteleiras, ou até mesmo as entidades de promoção de destinos, entendam que neste jogo não vale a pena ir a todas, nem tão pouco ir atrás de números, mas sim coincidir em conceito, em substância, em conteúdo, criatividade e qualificação da audiência. Sem essa preocupação, análise e filtro, ao invés de criar ligações positivas, podemos ser associados a “más influências”.

*Rodrigo Roquette, Marketing & Communications Director do 3HB Hotels.

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