Como gerir custos numa “economia de guerra”?

Por a 12 de Maio de 2020 as 7:00

A pandemia de COVID-19 que assolou o mundo e o país apanhou os hoteleiros de surpresa, levando ao rápido encerramento de hotéis e ao cancelamento de reservas para os próximos meses. Ainda a primeira batalha não acabou e já se vislumbra uma dura guerra nos tempos vindouros, com um cenário pautado por incerteza. Apesar dos desafios que todos os gestores, administradores e diretores enfrentam, este é o momento ideal para começar a preparar a recuperação, defende Miguel Paredes Alves, Presidente da HotelShop.

“É agora que se impõe definir uma estratégia, um plano de ação e os procedimentos a adotar quando a pandemia abrandar e os clientes voltarem a regressar. A gestão de custos não será só importante, como sempre, mas vai ser decisiva. Por isso, é absolutamente essencial definir – e definir já – uma nova estratégia que se adeque aos tempos que aí vêm, e que nada têm a ver com o que fizemos no passado”, explica à Publituris Hotelaria. Para o responsável da central de compras, é preciso, no entanto, perceber que depois de o surto da doença ser ultrapassado, haverá mudanças profundas. “Já não iremos ter tão depressa ocupações anuais de 80 e 90% como dantes. Os nossos principais países emissores estão de rasto, começando pela Espanha e pela Itália. Que irão, tal como nós, apelar ao tão bonito e tão nacionalista “faça férias cá dentro”. De tal forma que ir de férias ao estrangeiro vai parecer um crime de traição à pátria”, assume, adiantando que “a retoma será, por isso, lenta e dolorosa”. “O nosso mercado interno não tem força para compensar as perdas internacionais. E como vamos ter menos procura, mas a oferta mantém-se, os preços vão cair. E não vão cair pouco. Os meses que se seguirem à reabertura dos hotéis vão ser absolutamente críticos para a sua sobrevivência. Quando acabarem os ‘lay-offs’ simplificados e as moratórias de impostos, os hoteleiros voltarão a estar entregues a si mesmos”, alerta.

Desta forma, o especialista aconselha a que seja traçado, desde já, um plano de ataque para fazer face aos próximos desafios. Reorganizar departamentos, renegociar contas, alterar prioridades e refazer stocks são alguns dos conselhos. Afinal, como deve o hoteleiro gerir custos nesta “economia de guerra”?

Recursos Humanos
Adaptar as equipas ao fluxo do negócio é o principal aspeto a ter em consideração. “Terá de ser repensado o rácio empregado por quarto. Não faz sentido numa “economia de guerra” manter rácios da “economia de paz”. Entre outros motivos, porque vamos ter menos quartos ocupados e, sobretudo, porque vamos ser forçados a vendê-los mais baratos”, aponta, explicando que é aconselhável reduzir os custos laborais e recorrer ao outsourcing de RH.

Equipamentos e utilities
Quanto aos custos com equipamentos, estes devem sofrer uma redução para quase zero, optando-se pela reparação em vez da substituição sempre que possível. E recorrendo ao renting nesse caso. Os custos com utilities “podem e devem ser revistos e renegociados”. “Felizmente o setor da energia já é concorrencial, e a situação atual é um caso de força maior, que justifica (ou antes, impõe) que se revisitem as condições contratuais firmadas em tempos de normalidade”, refere.

Matérias-primas e consumíveis
Aqui, começar do zero e refazer processos é a palavra de ordem. Para Miguel Paredes Alves, é preciso mudar prioridades. Nos três vértices da pirâmide das compras, qualidade-preço-serviço, o preço é o ponto mais importante a considerar num contexto de crise. “Partir de uma base zero para a gestão de custos implica começar mesmo do zero. Começar por refazer a seleção de produtos. Refazer ementas, processos e stocks mínimos. Manter os parceiros que forem competitivos e substituir todos os que não forem. Temos de ser capazes de repensar as compras numa ótica de redução de custos perdendo o mínimo de qualidade, mas assegurando que cada euro gasto é o euro imprescindível, sem o qual gastaríamos mais do que iríamos poupar”, indica.

Pesquisa de fornecedores
Depois de repensar ementas e produtos a comprar, de forma a poupar 10, 20 ou 30%, impõe-se um trabalho de ‘sourcing’, pesquisando no mercado quem pode entregar esses produtos nas melhores condições de preço, qualidade e serviço.“Falando em primeiro lugar com os nossos parceiros de sempre, e em especial com os que se mostraram compreensivos quando a nossa tesouraria apertou. Dando-lhes prioridade em igualdade de circunstâncias. Mas sempre com transparência e frontalidade quando se trata de defender a sobrevivência da nossa empresa”, aconselha o especialista da Hotel Shop.

Negociação com fornecedores
A negociação com fornecedores, nesta fase, “é um momento crítico”, adianta o profissional. “O objetivo de sobrevivência da nossa empresa está em primeiro lugar. Devemos ser exigentes, mas só até ao limite do razoável. É essencial conhecer o mercado e saber até onde a outra parte pode chegar. Até porque os fornecedores da hotelaria estão tão mal ou pior que nós. Aqui, o know-how de quem faz a compra é essencial. E é tão mau um comprador que tudo aceita como aquele que tudo pede”, assegura.

Este processo de gestão de custos vai implicar “muitas centenas de horas e muito conhecimento de produtos, preços e fornecedores”, garante o presidente da central de compras que acredita que estarão em vantagem, neste processo, as cadeias hoteleiras com “um bom departamento de compras” e as centrais de compras.

“Nestes momentos difíceis, há novas prioridades. Os dogmas do passado, a supremacia da qualidade sobre tudo o resto acabou. Irá voltar, certamente. Mas para já, acabou. No pós-quarentena, teremos a supremacia dos custo. Quem não os souber gerir, gastando cada euro como se fosse o último, vai rapidamente chegar ao dia em que o vai mesmo gastar”, conclui.

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